Balada de Alzira
As coisas não existem.
O que existe é a ideia
melancólica e suave
que fazemos das coisas.
A mesa de escrever é feita de amor
e de submissão.
No entanto
ninguém a vê
como eu vejo.
Para os homens
é feita de madeira
e coberta de tinta.
Para mim também
mas a madeira
somente lhe protege o interior
e o interior é humano.
Os livros são criaturas.
Cada página um ano de vida,
cada leitura um pouco de alegria
e esta alegria
é igual ao consolo dos homens
quando permanecemos inquietos
em resposta às suas inquietudes.
As coisas não existem.
A ideia, sim.
A ideia é infinita
igual ao sonho das crianças.
–– extraído de “Balada de Alzira”, segundo livro de Hilda Hilst, publicado em 1951 pela Edições Alarico.